COM AJUDA DE UM SOFTWARE..ESCREVEU LIVRO COM NARIZ

PAULO MELO CORUJA NEWS............

Alexandra Szafir lança livro sobre os excluídos pela Justiça

'DesCasos' tem 82 páginas, foi escrito com o nariz e ajuda de um software.
Advogada de 42 anos convive há 5 com Esclerose Lateral Amiotrófica.

Emilio Sant'Anna Do G1 SP

Alexandra SzafirNo quarto de Alexandra, livros e documentos dividem espaço com aparelhos como respirador (Foto: Daigo Oliva/G1)
Foi por sempre “meter o nariz onde não era chamada” que Alexandra Lebelson Szafir deu a dezenas de pessoas o direito a uma defesa justa. Foi com o mesmo nariz - que alguns diriam intrometido - que a advogada criminalista de 42 anos escreveu o livro que lança nesta segunda-feira (31), em São Paulo.


“DesCasos: uma advogada às voltas com o direito dos excluídos” (Editora Saraiva) é um apanhado de histórias presenciadas pela autora em mais de dez anos de prática nos fóruns criminais. Nesse período, Alexandra conciliou seu trabalho como sócia de um importante escritório em São Paulo com a atividade gratuita prestada em penitenciárias, delegacias e associações.
Eu, que sempre prezei minha independência, tive que aprender a depender dos outros"
Alexandra Szafir
Irmã do ator Luciano Szafir, mãe de um casal de filhos (10 e 12 anos), Alexandra ganhou reconhecimento, recebeu do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) o Prêmio Advocacia Solidária e livrou da cadeia pessoas que passariam anos a fio sem ter direito a um defensor. Foi nesse período também que os primeiros sinais da ELA começaram a se manifestar.
ELA é a abreviação que mudou a vida de Alexandra e colocou seu nariz novamente em evidência. Esclerose Lateral Amiotrófica, a mesma doença do físico Stephen Hawking. Os primeiros sintomas começaram em 2005 e como ela descreve no livro “é um vilão bem pior que os seres humanos conseguem ser.”
Primeiro foram as pernas, depois as mãos e os braços também foram afetados. Em pouco tempo atingiu as costas, a capacidade de deglutir e falar. “Estava praticamente incomunicável, minhas ideias e meus pensamentos presos em minha cabeça”, relata Alexandra no livro.
Em seu quarto, ao lado da cama, livros empilhados e processos criminais disputam espaço com o respirador e todo o aparato necessário para mantê-la longe das complicações da doença. “Eu, que sempre prezei minha independência, tive que aprender a depender dos outros. Mas estou cercada de pessoas maravilhosas e não tenho vocação para ser infeliz, então minha vida familiar é o mais normal possível”, disse Alexandra ao G1, em entrevista por e-mail.
E-mail, computador, peças jurídicas, tudo isso graças ao seu nariz e a um software instalado no notebook por sua fonoaudióloga. O programa utiliza a webcam para reconhecer em seu rosto o ponto central: o nariz, que passa a comandar o mouse. Assim, cada letra vai sendo digitada em um teclado virtual
Alexandra levou cerca de dois anos para escrever o livro utilizando esse software. O que pode parecer resultado de um esforço sobre-humano se revela, na verdade, a consequência de um trabalho que nunca parou. “Meu trabalho hoje consiste, quase que todo, em redigir peças: defesas, habeas corpus. Mas, quando necessário, vou ao júri (escrevo meu texto de antemão), oriento outros advogados por e-mail ou Messenger. E, claro, continuo advogando gratuitamente”, afirma.
 
AbrELA
Alexandra SzafirCom o nariz, Alexandra escreve em um teclado
virtual (Foto: Daigo Oliva/G1)
ELA, ou Esclerose Lateral Amiotrófica, é uma doença rara e com causa ainda não completamente conhecida. Afeta os neurônios motores da medula espinhal e é progressiva.
Na maioria dos casos, leva de seis meses a um ano entre os primeiros sintomas e a completa paralisia, explica Jorge El-Kadum, titular e vice-presidente da Academia Brasileira de Neurologia (ABN) entre 2004 e 2008. “Quando começa a atingir a musculatura do bulbo cerebral começa a ter a falência respiratória”, diz.
Apesar da paralisia, a sensibilidade em todo o corpo é preservada. No entanto, não existe cura e as complicações podem se tornar constantes. “Existe sempre o risco da aspiração pulmonar, por isso é importante que o paciente fique sempre sob cuidados”, afirma El-Kadum.
Casos em que a doença evolui mais lentamente são mais raros, mas podem acontecer. “Cerca de 10% dos pacientes tem uma evolução da ELA mais lenta”, diz o neurologista.
A renda do livro de Alexandra será revertida para a Associação Brasileira de Esclerose Lateral Amiotrófica (AbrELA).