Haitianos questionam resultado da eleição e desordem toma conta de Porto Príncipe
Os helicópteros da missão de paz da ONU (Organização das Nações Unidas) sobrevoam a capital do Haiti, Porto Príncipe, nas primeiras horas da manhã dessa quarta-feira (08/12). Todos na cidade estão em alerta, apreensivos. Assim que as rádios locais anunciaram na noite de ontem que as eleições presidenciais haitianas serão decididas em um segundo turno, começaram a ecoar pelas ruas da capital do Haiti tiros e gritos de revolta. Logo em seguida, diversas barricadas foram montadas pela cidade, que dormiu iluminada pelo fogo ateado a colchões e pedaços de madeira.Efe
Manifestantes põem fogo em protesto contra resultado das eleições no Haiti
No bairro de Petionville, zona rica da capital, onde vivem também funcionários da ONU, aconteceram os primeiros enfrentamentos entre manifestantes e policiais, que seguiram durante toda a noite em outras partes de Porto Príncipe.
A principal reclamação dos protestantes é a forte suspeita de fraude que paira sobre as eleições. O Conselho Eleitoral declarou que Mirlande Manigat obteve 31% dos votos, enquanto Jude Célestin, 22% e o cantor Michel Martelly, 21% dos votos, apenas seis mil votos de diferença em relação ao segundo colocado. Mirlande é esposa de Leslie Manigat que, em 1988, foi deposto por um golpe de Estado após ganhar as eleições, enquanto Celéstin é apoiado pelo atual presidente, René Préval. De acordo com pesquisas de boca-de-urna, os mais votados teriam sido Manigat e Martelly, popular cantor haitiano, que angariou forte apoio entre os mais jovens.
Mas os resultados estão sendo questionados principalmente por eleitores de Martelly, que acusam o establishment politico de Préval de ter manipulado os votos. No entanto, eleitores de outros candidatos também foram às ruas protestar. “Não é possível que Celéstin tenha ganho tantos votos, é mentira! Com certeza houve fraude eleitoral. Nos colégios eleitorais muitas pessoas não puderam votar pois seus nomes não constavam na lista de eleitores”, afirmou ao Opera Mundi uma eleitora de Manigat. “Há outro dado grave: Mirlande Manigat teve mais de 37% dos votos, mas não elegeu sequer um senador ou deputado. Quase todos os eleitos são da coalizão de Celéstin. Como se explica isso?”, questionou.
Cólera
Além do clima de instabilidade política que se instalou no país, a violência impede que agentes humanitários e ONGs se movam livremente pela capital e em outras cidades, dificultado o atendimento de vítimas da epidemia de cólera, que já deixou mais de dois mil mortos.
Um relatório divulgado nesta terça-feira (07/12) revelou que a cólera entrou no país pelos capacetes azuis nepaleses da ONU. O médico francês Reanud Piarroux conclui que a explicação mais lógica para a propagação é a contaminação de um rio por soldados do Nepal baseados em um dos campos da Minustah, missão da ONU no país chefiada pelo Brasil. O porta-voz adjunto da Minustah, Vicenzo Pugliese, disse que o relatório não é conclusivo.
Magní Ervé, ex funcionário do Ministério da Agricultura e hoje pastor protestante, analisa com tristeza a situação do Haiti: “Os haitianos não são um povo acostumado a pegar em armas, o que é bom, pois em um momento como esse, a frustração acumulada durante tanto tempo pode ser incontrolável. Mas há limites, pois o povo está desesperado. Eles não tem nada a perder.”